Ver os outros criando é um porre. É dose pra elefante
Quem tem paciência para ficar vendo pessoas trabalhando? Só fiscal do Ministério do Trabalho faz isso.
Pense numa profissão bem legal. Qualquer uma. Vale um ofício que você gosta, curte muito, admira demais. Pode até ser um pouco mais exagerado, que tal algo que você ama, venera, tem grande paixão. Tudo bem, vamos ir pro lado do sonho, cite um cargo que seja o sonho da sua vida. Algo que você ainda quer fazer ou que teve intenção de ir atrás e desistiu. Escolha um trampo, de preferência, que não seja o seu próprio trabalho.
Vou enrolar mais um parágrafo pra você pensar bem.
Trabalho é um negócio que a gente vai lá, faz uma coisa, entrega, ganha elogios ou é xingado (ou as duas coisas), conversa com seu chefe Michael Scott e depois de um tempo recebe uma grana por isso. E isso se repete no dia seguinte. E no outro. E no outro. É uma rotina, uma coisa meio monótona. Às vezes tem alguma agitação, um clima tenso entre os broders, uns altos e baixos.
Tá, já se foram aí muitos caracteres e você, espero, escolheu uma profissão.
Você passaria um mês vendo uma galera desse trabalho que admirável em suas rotinas sem sal? Não vale mentira. Pois não importa se a pessoa é motorista, eletricista, artista ou ascensorista, no dia a dia tudo é monótono.
Eu não faria isso. Em hipótese alguma passaria um mês vendo outros seres humanos exercendo seus ofícios sem ganhar nada em troca. Só se eu fosse um cachorro olhando o dono trabalhar. E ainda assim o animal só faz isso pois não tem outra alternativa para garantir o almoço.
Tá, e se fosse editado? Só com os melhores momentos. Mas as melhoras cenas juntas chegam a oito horas de conteúdo. OITO HORAS. Ficar vendo gente criando, fazendo coisas que vão gerar produtos, objetos, realizar sonhos, aumentar o PIB, pagar as contas, etc, por mais de QUATROCENTOS MINUTOS, VINTE E QUATRO MIL SEGUNDOS.
É basicamente disso que se trata o documentário Get Back dos Beatles. Um dia eu estava de boa na minha casa e fui inventar de ver essa obra-prima. E eu só sabia que era um documentário sobre os Beatles e que a galerinha estava falando muito bem. Não tinha ideia de mais nada pois parei de ler resenhas e sinopses de coisas.
De repente, tinham se passado uns 30, 40 minutos de filme e eu só via os Beatles ensaiando e criando. Com direito a umas piadinhas. Tenha dó. Quem tem paciência para ficar vendo pessoas trabalhando desse jeito? POR HORAS E HORAS A FIO? Só fiscal do Ministério do Trabalho faz isso pois tem salário no fim do mês.
Imagine só ficar vendo Leonardo da Vinci pintar a Monalisa, Fernanda Montenegro decorando texto, Deus ditando o texto da Bíblia no ouvido do escriba, Spielberg ligando pra orçar preço de dinossauro, Elena Ferrante sentada na frente do teclado digitando. Socorro. SOS. Ver os outros criando é um porre.
Isso me lembra quando, nos idos dos anos 2000, o pessoal do Fantástico teve a excelente ideia de exibir a reunião de pauta do programa. Quem em sã consciência achou que seria bom filmar, editar e veicular na TV uma reunião de trabalho??? Em plena noite de domingo??? Espero que essa pessoa tenha sido promovida pela coragem.
Voltando ao documentário dos Beatles. Sinceramente, dava pra ter editado em no máximo uma hora de conteúdo. E olha que eu gosto dos Beatles. Quem me conhece sabe que eu tenho camisetas dessa galera até hoje. Inclusive, só resolvi assistir ao filme pois já vi outros documentários, li livros e reportagens sobre as mil histórias dos caras.
Como se não bastasse, o trailer do documentário é muito pega trouxa. É o caso do material editado de um jeito com ritmo completamente diferente do produto final.
Pra não falar que nada foi perdido, os 50 minutos finais do material inédito são do show no teto da Abbey Road, a última apresentação da banda. Pô, aí sim um negócio manero. Afinal, músico eu quero ir ao show e ouvir a música, não me interessa ver a pessoa compondo. Livro quero ler o livro, não ficar vendo a pessoa digitando. Mas sei que sou uma exceção e que tem fã capaz de tudo.
Pra mim esse filme, como disse o gênio Pedro Leite no Twitter, é a famosa DOSE PRA ELEFANTE.
Vou terminar com uma foto bem supimpa dos Beatles:
***OUÇA O QUICANDO
Se você só tem paciência para coisa rápida e curta seu lugar também é o Quicando, podcast que apresento com minha amiga Juliana Kataoka. Amanhã mesmo tem episódio inédito, ouve lá na Deezer clicando aqui.
***A INTERNET HEIN
A internet é cheia de dicas e curadorias disponíveis 24 por 7. E eu que não fico de fora dessa, deixo aqui o melhor dos últimos dias da internet brasileira:
1 - Primeiramente as verduras:
2 - E um pouco de frutas:
3 - E uma leitura:
A história de como a pandemia afetou adolescentes de 17 a 19 anos está neste link. Que dó dessa turma. Abaixo tem uma prévia da matéria.
4 - Atenção para o cachorro da semana:
5 - Uma história de amor e lanches:
6 - Dica de saúde e bem-estar:
***POR HOJE É SÓ
E vamos terminando mais uma Dia Sim, Dia Não. Boa semana e boa sorte. Fique agora com os links das edições anteriores.
Carisma parece até um negócio genético. Tem ou não tem.
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é um saco ver, mas acho que contribui pra quem quer ser artista ver que nada é mágica, é muito trabalho. e trabalhar com o que a gente gosta não deixa de ser trabalho.
dito isso, não vi & não verei esse doc pq tem que ser MUITO fã pra aguentar mesmo